O Governo angolano estima que a importação de produtos alimentares da cesta básica tenha caído cerca de 3% em 2015, mas ainda acima dos 3,5 mil milhões de euros, praticamente o dobro face 2013.
Os números constam de um documento de suporte à estratégia do Governo para ultrapassar a crise financeira provocada pela quebra nas receitas do petróleo, e que visa reduzir a dependência das receitas com as exportações de crude com a auto-suficiência alimentar.
De acordo com o documento, a importação de produtos alimentares básicos por Angola aumentou cerca de 94% entre 2013 e 2014, passando para um total anual de 3.982 milhões de dólares (3,6 mil milhões de euros), sobretudo pelo crescimento na compra ao exterior de leite em pó (100%), arroz (96%) e açúcar (96%).
Estas importações, até Novembro, segundo o documento governamental, desceram 3% em 2015, mas totalizam, em 11 meses, mais de 3.858 milhões de dólares (3,5 mil milhões de euros).
A farinha de trigo foi o produto alimentar, dos 13 que constituem a cesta básica desta análise, mais importado por Angola entre Janeiro e Novembro do ano passado, ascendendo a 787,6 milhões de dólares (715 milhões de euros).
Só em arroz, Angola importou em 2015 o equivalente a mais de 658,1 milhões de dólares (597 milhões de euros) e de açúcar 454,1 milhões de dólares (412 milhões de euros).
Além de o país poder produzir, internamente, a generalidade destes produtos alimentares da cesta básica, gerando postos de trabalho e receitas nacionais, a prioridade governamentais de inverter esta tendência prende-se com as consequências financeiras de investir as cada vez mais reduzidas divisas do país, devido à quebra nas receitas petrolíferas, com estas importações.
“Dado que os produtos alimentares básicos incluem produtos de grande consumo, é necessário aplicar medidas concretas para fixar a produção local desses produtos, a fim de chegar a uma substituição selectiva de importações”, recomenda a estratégia governamental.
Além de reduzir fortemente as importações, o objectivo do executivo passa por potenciar o incremento da produção nacional para exportação, gerando desta forma divisas, fora do sector petrolífero.
“No contexto do reforço da produção nacional, o objectivo é levar a um crescimento acelerado da produção nacional de produtos alimentares básicos, e outros produtos de sectores da pesca, da indústria, geologia e minas, com o compromisso expresso de atingir a auto-suficiência do nacional consumir dentro dos períodos de tempo a ser determinado para cada um dos produtos e serviços seleccionados”, define o documento de estratégia governamental.
Neste sentido, o Governo reconhece que os sectores da agricultura e da indústria transformadora, em especial a indústria de alimentos, são os que apresentam “grande potencial para a substituição de importações, a curto prazo”, tendo em conta as “estimativas promissoras de produções”.
Além destas linhas orientadoras e da promessa de canalizar mais de cinco mil milhões de euros de saldos de linhas de financiamento de projectos públicos para apoiar a diversificação da economia produtiva no sector privado, não foram ainda divulgadas pelo Governo medidas concretas a levar a cabo ou prazos de execução deste plano de diversificação da economia.
Radiografia divina
Diz a Igreja Católica de Angola, após ter saído do estado de coma auto-induzido há muito tempo, que no país se regista “o agravamento preocupante da pobreza das populações e a paralisação paulatina dos agentes económicos, devido às dificuldades na renovação de mercadorias por falta de poder aquisitivo”, bem como a “falta de critérios no uso dos fundos públicos, gastos exorbitantes, importação de coisas supérfluas, que não aproveitam às populações”.
“Aumenta assustadoramente o fosso entre os cada vez mais pobres e os poucos que se apoderam das riquezas nacionais, muitas vezes adquiridas de forma desonesta e fraudulenta”, acusa a Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (Ceast), que é peremptória ao afirmar que a crise actual em Angola deve-se também à “mentalidade de compadrio ao nepotismo, em acúmulo à discriminação derivada da partidarização crescente da função pública, que sacrifica competência e o mérito”.
Ao que parece, a velha receita de Kundi Paihama será recuperada para que os poucos que têm milhões continuem a ter cada vez mais milhões, compensados pelos milhões que têm pouco ou nada. E essa receita dizia: “Comam farelo porque os porcos também comem e não morrem”.